Segundo dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem 11.951.347 negros evangélicos. Desses, 8.676.997 (72,6%) são pentecostais, enquanto a população negra de umbandistas e candomblecistas não alcança 253.000 pessoas. Por que os negros fizeram opção pelo pentecostalismo?
Se relacionamos os dados de crescimento dos evangélicos no Brasil, veremos que o gráfico é semelhante à afirmação da população negra no Brasil. Embora tenhamos casos de exclusão racial na sociedade brasileira, a presença de negros nos púlpitos de igrejas evangélicas coincide com o processo de “indigenização” da doutrina e forma da igreja brasileira. Ocorreu, de modo mais visível, no curso do movimento pentecostal. O falecido pastor batista Nilson Fanini reconheceu ao afirmar: “A igreja católica fez a opção pelos pobres, mas eles fizeram opção pelo pentecostalismo”.
“Com gritos estranhos e pronunciando coisas que aparentemente nenhum mortal em seu juízo normal pudesse entender, teve início, em Los Angeles, a mais recente seita religiosa.” Foi isso o que disse a edição de 18 de abril de 1906 do Los Angeles Times. ‘As reuniões acontecem em um prédio decadente da rua Azusa, e os devotos de doutrinas estranhas praticam os ritos mais fanáticos, pregam as mais extravagantes teorias e se colocam em um estado de louca euforia quando se entregam ao fervor pessoal.”
A publicidade negativa realmente ajudou a trazer mais pessoas. Alguma coisa sobrenatural acontecia naquele prédio antigo. William J. Seymour, pregador batista negro, recém-chegado de Houston, chamava os crentes a dar um passo a mais. Na verdade, dois passos: ele queria que eles se “santificassem” e que fossem “batizados no Espírito Santo”. O batismo, dizia ele, seria acompanhado pelo falar em línguas.
Houve outras irrupções do falar em línguas ao redor dos EUA e da Europa nos anos anteriores, mas o acontecimento da rua Azusa foi a grande explosão. As reuniões continuaram naquele “prédio decadente” por vários anos. Muitas pessoas viajaram para lá simplesmente para ver o que estava acontecendo.
O mundo estava pronto para o avivamento. O final do século XIX assistiu à grande revolução industrial. As pessoas se tornavam engrenagens da máquina social. A lacuna entre os ricos e os pobres aumentava. Infelizmente, a igreja, com freqüência, pendia mais para os ricos. Até mesmo grupos “comuns” e tradicionais, como os batistas e os metodistas, enfatizavam mais os bens materiais do que a energia espiritual. Graças aos precursores avivalistas, como Finney e Moody, as igrejas estavam cheias. Porém, muitos que professavam o cristianismo ainda careciam de alguma coisa.
Marco Davi de Oliveira, em sua obra A religião mais negra do Brasil, tenta responder qual é a religião representativamente mais negra do Brasil e por que essa identificação dos negros. O pesquisador descobre que a religião com o maior número de negros não são as religiões Afro, nem a Igreja Católica, tão pouco os protestantes históricos, mas, sim, os pentecostais. Ele constata que os negros brasileiros se converteram e passaram a fazer parte das igrejas pentecostais, em grande número, nas últimas décadas. O que torna a igreja pentecostal a religião com maior número de negros no Brasil.
Um dos motivos para essa identificação negra está na capacidade da igreja pentecostal oferecer ao fiel uma valorização de sua autoestima por meio de seu culto e liturgia. A pobreza extrema é uma das responsáveis por uma baixa auto-estima e, conseqüentemente, por uma desvalorização pessoal do indivíduo, mas a igreja pentecostal atua preenchendo essa lacuna. Por exemplo, através dos dons espirituais, o fiel pode se expressar e se sentir especial, “através desse poder”.
Para o também estudioso do pentecostalismo latino americano, Jean- Pierre Bastian, nas práticas pentecostais, a conversão e a emoção são indissociáveis. Ao contrário da Teologia da Libertação que pretendia a construção do pobre como sujeito conscientizado, ou do protestantismo histórico que pretendia formar sujeitos autônomos e críticos, “o pentecostalismo constrói a categoria de pobre, não no plano cognitivo, mas no plano emocional, por um discurso de consolo e uma prática terapêutica”.
Muitos trabalhos acadêmicos recente passaram a reconhecer a presença das igrejas pentecostais em comunidades pobres das grandes cidades brasileiras e relacionar com a ascendência dos negros na sociedade brasileira. Ser negro e, além disso, evangélico, não era decisão fácil há algumas décadas atrás no Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário